
Autor: Pr. Samuel
Nelson
A Igreja de Cristo não é uma casa sem governo, onde cada um faz como quer e onde existem tantas opiniões como há membros. Não! Há uma cabeça, e esta é Cristo, e Ele planeja, dirige, providencia, corrige e faz a sua obra crescer. Não há outro Senhor; e
ainda que Ele esteja assentado sobre o trono no céu, está conosco até a
consumação dos séculos.
Os apóstolos afirmam
que Cristo, depois da ascensão, tomava parte na sua obra e governo. Está
escrito: “Enquanto isso acrescentava-lhes o Senhor, dia a dia, os que se iam
sendo salvos” (At 2.47, ARA). “Pela fé em o nome de Jesus, é que esse mesmo
nome fortaleceu a este homem que agora vedes e reconheceis; sim, a fé que vem
por meio de Jesus deu a este saúde perfeita na presença de todos vós” (At 3.16,
ARA).
Os discípulos oram
para que milagres e prodígios aconteçam em nome de Jesus (At 4.30). Sobre o
contínuo crescimento de crentes, a Escritura diz: “Cada vez mais se agregavam
crentes ao Senhor”. Os apóstolos eram só despenseiros e testemunhas de Cristo e
das coisas do Reino de Deus. Jesus revelou-se a Estevão confortando o seu servo
que sofreu o martírio. O Senhor falou a Ananias para visitar Saulo em Damasco,
pôs-se ao lado de Paulo na cidadela de Jerusalém e falou-lhe depois de ter sido
preso e apresentado ao Sinédrio.
O Senhor age do seu
trono; por isso, Ele mandou o Espírito Santo para que não fôssemos deixados
órfãos; antes, por Ele, fôssemos consolados, ensinados, conhecedores de Jesus,
guiados, revestidos e para que por Ele Cristo fosse glorificado (Jo
14.16,17,26; 15.26; 16.13,14; At 1.8).
Desse modo, a igreja
onde Jesus Cristo é exaltado como Senhor e o Espírito Santo é aceito como
diretor e é obedecido ocupa o lugar designado por Deus nesta dispensação.
Existem muitas igrejas que estão fora do lugar espiritual, que se chamam
cristãs, mas que estão iguais à Igreja de Sardes, ou seja, perecendo ou à
morte. Já outras igrejas estão como a de Laodiceia, onde o Senhor estava fora
batendo à porta dos que tinham ouvidos para ouvir a voz do Espírito e
oferecendo privilégios para os que o desejassem e abrissem-lhe a porta.
O governo de Cristo, o
Sumo Sacerdote do povo de Deus na Nova Aliança, é efetuado pelo mesmo Agente
diretor e executor que operava com Cristo quando Ele andava sobre a terra, isto
é, o Espírito Santo (cf. Lc 4.1,14,18). Esse governo foi anunciado por Cristo
como provindo do Pai quando disse: “[...] rogarei ao Pai, e ele vos dará outro
Consolador, para que fique convosco para sempre” (Jo 14.16).
O citado governo nunca
será mudado enquanto durar a dispensação. Muitas pessoas, até mesmo teólogos,
quando tratam desse assunto, querem limitar as manifestações do Espírito Santo
para certo tempo ou tempos, como quando ao período em que os apóstolos viviam
sobre a terra. Há outros que limitam as manifestações a certo avivamento que
ocorrerá antes do começo do reino milenial. Estes, porém, não veem o absurdo em
que incorrem pela incredulidade dos seus corações, limitando o Espírito Santo a
certas manifestações inteligíveis ao homem, enquanto desprezam outras como
sendo desnecessárias ou não compatíveis com os tempos atuais.
Presumem, assim, que o
Espírito Santo, que é Deus, está acorrentado a opiniões duma sabedoria que é
humana e que exalta os valores da cultura e do intelecto do homem destituído da
glória de Deus. Seguindo tais opiniões e transformando-as em dogmas, os homens
tornam-se insubmissos ao Espírito Santo, o diretor e executor de Cristo na
Igreja, julgando-se mestres e guias. Eles não entram e nem deixam os outros
entrarem no domínio do Espírito Santo, faltando-lhes, dessa forma, a visão
celestial; por isso, laboram pensamentos e caminhos tão diferentes aos de Deus
e, assim como o céu está mais alto que a terra, essas pessoas são verdadeiras “estrelas
errantes” que fazem os outros pecarem e, no seu atrevimento e obstinação,
caluniam as coisas espirituais. Apesar disso, ignoram que, “na destruição que
fazem certamente serão destruídos”, como dizem os apóstolos Pedro e Judas em
suas epístolas.
Se estudarmos o livro
de Atos dos Apóstolos — ou como era chamado no segundo para o terceiro século,
o Atos, e, neste título, seguido por um dos mais eminentes editores dos textos
gregos do Novo Testamento, Tiochendorff (1815–74), que, no século passado, fez
a descoberta do Codex Simaitico em 1859, um dos documentos bíblicos mais
importantes, sendo assim chamado pelo lugar onde foi encontrado —, veremos que
o Espírito Santo é o diretor e executor das obras narradas neste livro. Em
função disso, muitos acham que o nome do livro deveria ser Atos do Espírito
Santo.
1. A Responsabilidade e a Obra do
Espírito Santo no Governo Hierárquico de Cristo na sua Igreja
Muitos têm perdido a
visão do Espírito Santo como uma pessoa a quem foi entregue a parte importante
de oferecer consolo, de agir como advogado ou defensor e de dirigir o avanço
triunfal da igreja sobre a terra. Estes veem nEle mais um elemento ou
influência benéfica que pode ser aproveitado em tempos de emergência e que se
pode limitar como for conveniente em certas ocasiões não oportunas. Muitos
querem aproveitar-se do Espírito Santo como um elemento e esquecem-se de que
Ele é Deus. Quantas igrejas não têm as suas portas e janelas fechadas e não
deixam o Espírito Santo ocupar o lugar que lhe é reservado por Cristo.
Certa ocasião, estava
eu sentado num grande templo quando vi uma pomba tentando entrar no recinto,
mas as janelas estavam bem fechadas, e todo o esforço que ela fez foi em vão,
pois os vidros impediam a sua entrada. O incidente chamou-me a atenção, porque há
muitas igrejas que estão com as janelas espirituais fechadas e não deixam o
Espírito Santo, que veio sobre Jesus em forma de pomba, entrar e ter o lugar
que lhe pertence. Estão cercadas de vidro que impedem a entrada do sopro do
Espírito que dá vida. Enquanto procuram conservar a forma, a ética e a
estética, estão como aqueles museus em que podemos ver vidros que conservam
animais em álcool ou formol — eles não perderam as suas formas e suas cores,
mas, sim, a vida.
Com a descida do
Espírito Santo no dia de Pentecostes, formou-se a Igreja, o Corpo de Cristo, e
como Paulo diz em 1 Coríntios: “Em um só Espírito, todos nós fomos batizados em
um corpo” (12.13, ARA). Essa unidade é uma realidade surpreendente quando,
entre os membros da igreja, existe diversidade de raças, de posição social, de
instrução e costumes, mas é o mesmo Espírito que domina e opera em todos.
A unidade e a
perseverança em esperar a promessa do Pai fez com que todos os discípulos de
Jesus reunidos ficassem cheios do Espírito Santo. A unidade do domínio é clara.
Os discípulos não usavam expressões extáticas desconexas de galileus, num
dialeto provincial, mas diversas línguas bem conhecidas deste povo disperso,
que estava reunido no Pentecostes em Jerusalém, que andara e vivera entre todas
as nações vizinhas e outras muito distantes.
Pelo domínio do
Espírito Santo, a diversidade de pessoas funde-se numa unidade completa, e a
unidade perfeita da Igreja manifesta-se em diversidades múltiplas que servem a
um mesmo alvo que se torna um conjunto harmonioso.
O apóstolo Pedro não
foi um agente do Senhor no dia do Pentecostes, mas ele e os 11 apóstolos foram
instrumentos usados pelo Espírito Santo. Em Atos 4.25-29, Pedro e João voltaram
da prisão e, reunidos com os seus, oraram: “[Senhor]... por intermédio do
Espírito Santo, por boca de Davi, nosso pai, teu servo. Senhor... concede aos
teus servos que anunciem com toda a intrepidez a tua palavra” (ARA).
Davi não era o agente
e muito menos o autor do segundo Salmo, pois os que oraram também declararam
que as palavras eram do Senhor, que o agente era o Espírito Santo e que o
instrumento era a boca de Davi. Assim também diziam os apóstolos, uma vez que
não tinham maior pretensão do que servir como boca para exaltar o nome sobre
todo o nome. Os verdadeiros servos do Senhor agem dessa maneira. João Batista,
por exemplo, estava satisfeito por ser uma voz que clamava no deserto sem
tornar-se notável entre os homens.
Muitas passagens das
Escrituras confirmam a personalidade do Espírito Santo. Pedro acusou a Ananias
e Safira de mentirem contra o Espírito Santo; os apóstolos disseram: “Nós somos
testemunhas acerca destas palavras, nós e também o Espírito Santo” (At 5.32;
20.23). O Espírito Santo aponta e comissiona missionários (At 13.2), dirige
ministros para onde deviam ir e pregar, detendo-os para não seguirem os seus
próprios caminhos (At 8.29; 10.19; 16.6,7).
As palavras do
Espírito Santo são resistidas pelos corações endurecidos, mas são para conforto
dos que caminham no temor do Senhor (At 7.51; 9.31).
O concílio de
apóstolos, presbíteros e a igreja em Jerusalém chegaram a uma resolução unânime
quando o bom parecer do Espírito Santo venceu a grande discussão (15.7,28). Não
sabemos como o parecer do Espírito Santo foi revelado, mas havia diversos dons
e ministérios do Espírito por meio dos quais o seu parecer deve ter sido
revelado, e não por votação da maioria como os homens fazem.
O livro dos Atos dos
Apóstolos revela-nos a importância do governo divino na Igreja Primitiva e
termina com um versículo para o qual ainda haveria continuação, e creio que o
Espírito Santo deixou Lucas assim, sem mencionar a morte dos principais
apóstolos, porque a obra é do Espírito Santo e ela não terminaria com os
apóstolos e ainda não terminou. Os homens eminentes em Teologia em geral
apreciam mais a sua própria exegese das Escrituras e o governo que lhes apraz
do que a interpretação do governo do Espírito Santo, que exige ouvido aberto
como discípulo, e não de mestre, e a submissão para andar por fé, e não por
vista.
Muitos crentes vivem
uma vida espiritual, mas quando se trata do governo da igreja, não veem o lugar
do Espírito Santo, uma vez que procuram o saber e a experiência dos homens, e é
por isso que encontramos tantas divergências no meio do cristianismo. Como tem
havido homens que se têm salientado como ministros do evangelho, em parte, uns
têm-se firmado mais e outros menos da Palavra revelada; já outros têm seguido algum
ramo da evolução histórica no cristianismo e, dessa forma, uns têm-se embaraçado
mais e outros menos no crescimento espiritual, por não permitirem que o
Espírito Santo tenha o seu lugar.
O livro dos Atos
revela-nos que o Espírito Santo ocupou e deve ter o lugar preeminente em tudo o
que se relaciona com a escolha de ministros, preparo, ordenação, direção,
evangelização, confirmação, correção e crescimento da igreja.
Cristo é o Sumo
Sacerdote no céu sobre o trono; mas na Terra, no santuário de Deus, os remidos
lavados, os santificados e os justificados são santificados pelo Espírito
Santo, que intercede por nós com gemidos inexprimíveis (1 Pe 1.2; Rm 8.26,27).
Ele é o Agente operador que reside em cada membro do Corpo, que liga o Sumo
Sacerdote segundo a ordem de Melquisedeque com a geração eleita, o sacerdócio
real.
Há muitos que dizem
que são de Jesus, mas não aceitam a direção e a obra do Espírito Santo, agindo,
dessa forma, como os escribas e fariseus: Ai
de vós, escribas e fariseus, hipócritas! Pois que edificais os sepulcros dos
profetas e adornais os monumentos dos justos e dizeis: Se existíssemos no tempo
de nossos pais, nunca nos associaríamos com eles para derramar o sangue dos
profetas. Assim, vós mesmos testificais que sois filhos dos que mataram os
profetas. Enchei vós, pois, a medida de vossos pais. Serpentes, raça de
víboras! Como escapareis da condenação do inferno? (Mt 23.29-33)
Não há dúvida de que
essa é uma linguagem forte, mas há muitas pessoas que querem Jesus de longe,
não de perto. Estes não têm o Espírito de Cristo; por isso, preferem ser
mimados como crianças para fazerem a consciência dormir e terem belos sonhos
religiosos. No começo, as concessões são pequenas, mas, ao final, suas
histórias de vida são parecidas com a de Sansão, que se deixou envolver aos
poucos. Eis o estado triste de muitos que resistiram ao Espírito Santo e à sua
obra.
1. A Importância do Batismo no Espírito
Santo no Governo Hierárquico do Novo Testamento
Para um governo
tornar-se harmonioso e próspero, é necessário que o povo esteja unido ao seu
governo e, também, entre si individualmente.
No Antigo Testamento,
sob o governo hierárquico aromitico, o povo de Judá tinha muitas razões de
estar unido: o mesmo Deus, a mesma lei e serviço religioso, a mesma raça, um
passado histórico, as mesmas aflições em cativeiro e, de vez em quando, a
ameaça dos povos conquistadores ao redor. Não existia, contudo, uma união
verdadeira em redor do seu Deus e da sua Lei, pois os interesses da política
dos povos vizinhos e dos partidos religiosos dividiam o povo em facções. Era
muito difícil alcançar unidade entre um povo da mesma raça, Deus, lei, serviço
religioso, educação, costumes, etc. Seria difícil alcançar essa unidade entre
um povo, onde a raça, os conceitos herdados, a educação, as circunstâncias e o
modo de vida divergiam se Deus, em sua sabedoria divina, não tivesse preparado
um meio mais sublime e eficaz do que existia entre o povo do Antigo Testamento.
O Senhor, ao prometer
uma Nova Aliança ao seu povo por meio de Jeremias, diz: “[...] porei a minha
lei no seu interior e a escreverei no meu coração; e eu serei o seu Deus, e
eles serão meu povo” (31.33). Se o ministério da morte, escrito e gravado em
pedras, revestiu-se de glória, como não será mais glorioso o ministério do
Espírito? Na Nova Aliança, encontramos a glória excelente, uma vez que o que
nela opera não é mais um mandamento carnal, cheio de fraqueza, mas, sim, o
poder de uma vida indissolúvel que faz todas as coisas novas, onde temos sido
santificados uma vez para sempre pela oferta do corpo de Jesus Cristo e onde
vivemos na santificação do Espírito para obediência.
Pelo batismo do
Espírito Santo, somos o santuário de Deus, onde o Espírito entrou e habita. Em
João 14.17, está escrito: “[...] porque [o Espírito] habita convosco e estará
em vós”. A primeira parte fala da experiência dos discípulos antes do
Pentecostes, e a segunda depois do Pentecostes. Para preservar essa feliz
comunhão, é necessário que nos lembremos de não pecar contra o Espírito Santo.
Quando Deus habita em
nós, modifica todo o nosso interior, pois o seu amor é derramado pelo Espírito
Santo. Ele estabelece um ambiente unitivo, uma vez que nos foi dado beber de um
só Espírito e não há mais sequer judeus ou gregos, nem escravos ou livres, mas
em um só espírito fomos batizados todos nós em um só corpo (Rm 5.5; 1 Co
12.13).
Deste batismo glorioso
no Espírito, veio a nós a unidade que é mais forte que qualquer outra relação,
pois é o amor de Deus que une, e tal unidade está aconselhada para
diligentemente guardar no vínculo da paz (Ef 4.3). Se não nos enchermos do Espírito,
até mesmo as coisas que são lícitas invadirão o nosso coração, perturbarão a
nossa comunhão com Deus e o vínculo entre os irmãos. A vitória que vence o
mundo é a nossa fé, e esta agiu no meio dos apóstolos, pois eles receberam
ameaças e viveram tribulações, mas, ao suportá-las, ficaram cheios do Espírito
Santo (At 4.24-31).
Portanto, o dom do
Espírito Santo foi derramado para guardar a unidade e para haver um governo
completo e harmonioso de Cristo em sua igreja. A descida do Espírito Santo com sinais,
tais como houve no princípio, convenceu Pedro, estando na casa de Cornélio, de
que não havia separação de raças na Igreja de Cristo, e ele lembrou-se da
palavra do Senhor: “João, na verdade, batizou com água, mas vós sereis
batizados com Espírito Santo” (At 1.5) e, por isso, tendo os que creram
recebido o mesmo dom que os apóstolos receberam na descida do Espírito Santo no
Pentecostes, não resistiu a Deus, mas batizou-os em água. Não foi a água que os
uniu; muitos olham hoje para o batismo da água como união, outros para a
denominação a que pertencem, mas foi o batismo no Espírito que os uniu;
entretanto, ninguém despreze ou ignore o batismo na água ou as denominações,
mas tenhamos sempre em evidência as primeiras coisas do Reino de Deus, para
nunca colocarmos as de menor importância em primeiro lugar. Lembremo-nos das
palavras de Jesus aos escribas e fariseus: “[...] hipócritas, porque dais o
dízimo da hortelã, do endro e do cominho e tendes negligenciado os preceitos
mais importantes da lei: a justiça, a misericórdia e a fé; deveis, porém, fazer
estas cousas, sem omitir aquelas” (Mt 23.23).